segunda-feira, 8 de abril de 2013

6 Contos Sufís

Mulla Nasrudin (Khawajah Nasr Al-Din) viveu no século XIV. Contou e escreveu histórias onde ele próprio era a personagem. São histórias que atravessaram fronteiras desde a sua época, enraizando-se em diversas culturas. Elas compõem-se num imenso conjunto que integra a chamada Tradição Sufi, ou o Sufismo, uma seita religiosa da antiga tradição persa, que se tem espalhado desde então pelo mundo.
CONSELHOS: Nasrudin começou a construir uma casa. Os seus amigos, que tinham cada um, a sua própria casa, e todos eles eram carpinteiros e pedreiros, rodearam-no de conselhos. Mulla estava radiante! Um após outro, e às vezes todos juntos, disseram-lhe o que fazer.
Nasrudin seguia docilmente as instruções que cada um lhe dava. Quando a construção terminou, ela não se parecia em nada com uma casa.
- Que curioso! - disse Nasrudin - e contudo eu fiz exactamente aquilo que cada um de vocês me tinha dito para fazer…”

PASSEIO DE BARCO

Nasrudim às vezes levava as pessoas para viajar no seu barco. Um dia, um pedagogo exigente contratou-o para transportá-lo para o outro lado de um rio, muito largo. Assim que se lançaram à água, o sábio perguntou-lhe se faria mau tempo. –“Não me pergunte nada sobre isso” - disse Nasrudim.
- “Você nunca estudou gramática?” – “Não!” – “Nesse caso, metade da sua vida foi desperdiçada"
O Mulla não disse nada. Porém, logo de seguida, desabou uma terrível tempestade. O pequeno e desorientado barco de Mulla, começou a encher-se de água. Ele inclinou-se para o companheiro e perguntou-lhe:
- “Alguma vez você aprendeu a nadar?” –“Não!” – respondeu o pedante
. – “Nesse caso, caro mestre, toda a sua vida foi desperdiçada, pois estamos a afundar-nos e eu, que nunca aprendi gramática, vou apenas salvar a minha pele.

DESEJOS
A festa reuniu todos os discípulos de Nasrudin. Comeram e beberam durante muitas horas, sempre a conversar sobre a origem das estrelas e dos propósitos da vida. Quando já era quase de madrugada, preparavam-se todos para voltar para as suas casas.
Restava um belo prato de doces sobre a mesa. Nasrudin obrigou os seus discípulos a comê-lo.
Um deles, porém, recusou:- ‘O mestre está-nos a testar. Quer ver se conseguimos controlar os nossos desejos?”
- “Estás enganado!” –respondeu Nasrudin – “ A melhor maneira de dominar um desejo, é vê-lo satisfeito. Prefiro que vocês fiquem com o doce no estômago, do que com ele no pensamento, que deve ser usado para coisas mais nobres.”

NASRUDIM E O OVO

Certa manhã, Nasrudin colocou um ovo embrulhado num lenço, foi para o meio da praça da sua cidade, e chamou aqueles que andavam por ali.
- “Hoje vamos ter um importante concurso! A quem descobrir o que está embrulhado neste lenço, eu dou de presente o ovo que está dentro!”
As pessoas olharam-se, intrigadas, e responderam:
- “Como podemos saber? Ninguém aqui é capaz de fazer esse tipo de previsões!”
Mas Nasrudin insistiu:- “O que está neste lenço tem um centro, que é amarelo como uma gema, cercado de um líquido da cor da clara, que por sua vez está contido dentro de uma casca, que se parte facilmente. É um símbolo de fertilidade, e lembra-nos dos pássaros que voam para seus ninhos. Então, quem é que me pode dizer o que está aqui escondido?”
Todos os habitantes pensavam que Nasrudin tinha nas suas mãos um ovo, mas a resposta era tão óbvia, que ninguém resolveu passar essa vergonha diante dos outros. E se não fosse um ovo, mas algo muito importante, produto da fértil imaginação mística dos sufis? Um centro amarelo podia significar algo do sol, o líquido em seu redor talvez fosse um preparado alquímico. Não, aquele louco estava a querer fazer alguém passar por ridículo.
Nasrudin perguntou mais duas vezes, e ninguém respondeu. O receio do ridículo tolheu-lhes a língua…

CASAMENTO
Nasrudin estava conversando com um conhecido, que indagou:
- “Mullah, responda-me, você nunca pensou em se casar?”
- “Sim, claro que já! Quando eu era jovem, determinei-me a achar o meu par perfeito. Cruzei o deserto, cheguei a Damasco, e conheci uma mulher belíssima e espiritualmente muito evoluída; mas as coisas triviais, do dia a dia, atrapalhavam-na.
Mudei de rumo e lá estava eu, em Isfahan; ali pude conhecer uma mulher com o dom para as coisas materiais, da vida caseira, e além disso mostrou-se muito espiritualizada. Porém, faltava-lhe a beleza física. Pensei: o que fazer? E então resolvi ir até ao Cairo.
Quando lá cheguei, fui apresentado a uma linda jovem, que também era religiosa, boa cozinheira e conhecedora dos afazeres do lar. Ali estava a minha mulher ideal.
- "Entretanto você não se casou com ela. Porquê"?
- “Ah, meu prezado amigo, porque ela também estava em busca do homem ideal.”

MERCADO
Certa manhã, quando se dirigia ao mercado, Nasrudin viu alguns cegos e, fazendo tilintar as moedas da sua bolsa, disse em voz alta:
- “Amigos, amigos, peguem estas moedas. Tu, toma esta, tu, esta, e vocês repartam o resto” – e, enquanto fazia isso, fazia tilintar as moedas da sua bolsa.
É evidente e seria até demais esclarecer, que não repartiu um só tostão. Produzida a cena, afastou-se para observar a seguinte situação:
Os cegos começaram a precipitar-se uns sobre os outros, exclamando e gritando: "deu tudo para ti".
Ou então:" Vocês ficaram com tudo ao invés de repartir". " Eu nada recebi", " mentes", " dá-me a minha parte", etc. etc.
Estas cenas transforam-se em empurrões, socos, pontapés, insultos, terminando numa grande batalha indescritível, dada a cegueira total reinante.
Nasrudin, que seguia de perto as peripécias da batalha, murmurou:
- "Isto é o que poderia chamar-se de "uma luta de cegos, por motivo inexistente".


CONCLUINDO:
...assim somos nós construtores de problemas imaginários, onde deveria somente reinar a tranquilidade do ser.








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