sábado, 4 de maio de 2013

Falando de gatos...

Quem não se relaciona bem com o próprio inconsciente, não gosta de gatos! 

O gato vê mais e vê dentro e além de nós. Relaciona-se com fluídos, auras, fantasmas amigos e opressores. O gato é médium, bruxo, alquimista e parapsicólogo. É uma chance de meditação permanente ao nosso lado, a ensinar paciência, atenção, silêncio e mistério. 
O gato é um monge silencioso, meditativo e sábio, cujo monge, nos devolve as perguntas medrosas esperando que encontremos o caminho na sua busca, em vez de o querer preparado, já conhecido e trilhado. Ele vê além, por dentro e pelo avesso. Relaciona-se com a essência. Se o gesto de carinho é medroso ou substitui inaceitáveis (mas existentes) impulsos secretos de agressão, o gato sabe!
E defende-se do afago! A relação dele é com o que está oculto, guardado, e nem nós queremos, sabemos ou podemos ver. Por isso, quando surge nele um acto de entrega, de subida no colo ou manifestação de afecto, é algo muito verdadeiro, que não pode ser desdenhado. É um gesto de confiança que honra quem o recebe, pois significa um julgamento.

O amor do gato pelo dono é de desapego, pois enquanto o dono (inconscientemente) precisa, ele está por perto, quando não, o gato afasta-se.
No Egipto dos faraós, o gato era adorado na figura da deusa Bastet, representada comumente com corpo de mulher e cabeça de gata. Esta bela deusa, era o símbolo da luz, do calor e da energia.

(The Mythology Of Cats, Gerald & Loretta Hausman)

 São guardiões da pequena caixa dos bruxedos,
onde se jogam paixões e destinos.
Alguns, trazem no olhar, tão fundo, 
a trama de um mistério insondável,
a teia de um segredo sem ter fim.
Acordam na noite, entre afagos, 
o sobressalto ancestral de outros medos
que se multiplicam, felinos,
na arena branca do nosso sono
vigiado pelos olhos que não dormem,
mesmo quando o corpo está imóvel.

Morrem, pudicamente, nos recantos da casa,
hirtos e discretos como monges,
renunciando ao espectáculo das mortes
que pedem luz e palco. Enterramo-los
na terra mole do Outono,
num canteiro de hortências,
de onde sairão mais tarde,
disfarçados de brisa, a caminho
de um fresco egípcio ou de uma tela
de Lorenzo Lotto, representando a Anunciação.
Estão nos retratos como na vida:
senhores do que sabem, tão secreto,
que só o sopro da alma, quando parte,
de vez os aparta do que foram.

("O Livro dos Gatos" de José Jorge Letria)

 Há um gato numa tela de Chagall,
sentado numa mesa, em pose,
com uma saia comprida. É uma fêmea 
e assenta-lhe bem o tecido vermelho
da blusa saída das tintas do pintor.
Talvez tenha um encontro marcado,
talvez espere parceiro à mesa do seu tédio,
sob uma janela que dá para a noite,
janela entreaberta para o sortilégio das estrelas.
É uma gata sentada à mesa
do seu absoluto e inconfessável mistério.
Ficou no quadro como na memória:
imitando as mulheres que escrevem os dias
com a tinta negra do cansaço da idade. 

("O Livro dos Gatos" de José Jorge Letria)


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