quarta-feira, 17 de julho de 2013

SINFONIA INCOMPLETA

As grandes obras são sonhadas pelos génios, executadas pelos lutadores, desfrutadas pelos felizes e criticadas pelos inúteis crónicos.
Esta é uma crítica à visão empresarial de uma escola.
Uma brigada especializada em métodos de organização e administração, visitou a Universidade de Liverpool, para inquirir sobre a eficácia (ou falta dela), do gabinete do vice cancelário.

A visita coincidiu com um dos concertos da Real Orquestra Filarmónica de Liverpool, a que sempre assistia o vice cancelário.
Nesta ocasião, contudo, ele não podia assistir ao concerto e, com a sua habitual generosidade ofereceu o bilhete ao chefe da brigada, que nunca tinha assistido a um concerto, ainda que tivesse recebido na escola educação musical.
A obra principal do programa dessa noite era a Sinfonia Incompleta de Schubert.
Na manhã seguinte, quando o vice cancelário perguntou à sua visita se tinha gostado do concerto, com grande espanto viu que este lhe entregava um relatório, com duas páginas dactilografadas, onde se lia:

“ 1 - Durante períodos consideráveis, os quatro tocadores de oboé não tinham nada que fazer. O seu número devia ser reduzido e o trabalho mais convenientemente distribuído pelo concerto todo, eliminando assim pausas de actividade.

2 - Todos os 12 violinos tocavam as mesmas notas. Isto parece uma duplicação desnecessária. O pessoal desta secção deve ser drasticamente reduzido e se realmente se deseja um volume de som maior isto pode ser obtido por meio de um amplificador electrónico.

3 - Gastou-se grande esforço em tocar semifusas. Isto parece um refinamento excessivo e recomenda-se que se reduza o valor das notas a fusas. Se isto se fizer, será possível usar estagiários e, até, trabalhadores menos especializados.

4 - Parece haver muitas repetições de passagens musicais. Nenhum objectivo se consegue repetindo os metais uma passagem que já tinha sido tocada nas cordas. Se todas estas passagens redundantes forem eliminadas a duração total do concerto que foi de duas horas, será reduzida a 20 minutos e não haveria necessidade de um intervalo. Além disso, se o compositor tivesse considerado estes pontos possivelmente teria podido acabar a sua Sinfonia."


(Trevor Thomas; In Diário de Lisboa, 21 de Outubro de 1973)

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