quinta-feira, 27 de outubro de 2011

As talentosas Gueixas

No Japão a condição de Gueixa é cultural, simbólica repleta de status, delicadeza e tradição.
Quando falamos em gueixas ou geishas, muitos pensam que são prostitutas orientais, mas a história não começou assim. Como o seu nome indica a palavra (guei)芸, significa "arte" e (sha),者que significa "pessoa" ou "praticante". Assim, a gueixa é a pessoa que faz arte. O termo geiko (芸子) é também usado no dialecto de Quioto, para descrever as gueixas, especialmente no bairro Hanamach.
Portanto as Gueixas ou Geishas, são mulheres altamente treinadas na arte milenar da sedução, dança e canto.

Ao contrário do que muitos pensam, elas não trabalham comercialmente com sexo. Com a sua rara beleza exótica, a sua perspicácia e delicadeza, elas são escolhidas para animarem encontros de negócios; pois são consideradas as companhias ideais por muitos empresários e executivos.

A ORIGEM DAS GUEIXAS

Hideyoshi Toyotomi, que foi um Daymyo do Período Sengoku, responsável por unificar o Japão dando relevo às inúmeras heranças culturais, autorizou a construção de um edifício na vizinhança de Kyoto, fechado ao exterior por paredes, que era exclusivamente dedicado ao prazer. Deu-lhe o nome de Shimabara, onde era incluído as artes do desfrute, bebidas, e prostituição luxuosa. As cortesãs (as oiran) trabalhavam ali como prostitutas caras, e atraíram clientes ricos. Muitos artistas também trabalhavam nas mesmas casas, entretendo os clientes com música, danças e poesia. Durante um longo período, esses artistas eram homens, que se chamavam “geisha” (artistas), “hōkan” (gracejadores) ou “taikomochi” (tamborileiros, porque eles tocavam o taiko, um tambor japonês).
Como muitas coisas na cultura japonesa, o mundo das prostitutas começou a ficar muito complicado. Cada homem que desejava estar com uma “oiran”(prostituta) tinha de seguir rituais difíceis e uma complicada etiqueta, por isso, só um homem muito rico ou um nobre poderia ter acesso a uma.

Por essa razão, muitas casas de chá (ochaya) apareceram fora de Shimabara e assim, algumas mulheres praticavam o “sancha-joro” (prostituição), mais barata.
Contudo, havia também outras mulheres, chamadas “odoroki” (meninas dançarinas), que cantavam e actuavam como dançarinas, que ficaram muito populares.
E assim, alguns clientes, começaram a chamar-lhes “geishas”, como aos artistas masculinos, que trabalhavam em Shimabara.
Mais ou menos no ano 1700, as gueixas femininas tornaram-se muito mais populares do que os seus concorrentes masculinos. Alguns anos depois, quase todas as gueixas eram mulheres.
Mas o governo, para divulgar e promover a sua cultura, achou que as gueixas eram boas embaixatrizes para dar uma boa imagem do país e promologou leis que as proibiam de trabalhar como prostitutas, dando-lhes permissão para actuarem apenas como artistas de entretimento.

Uma dessas leis, obrigava-as a atar o seu obi (faixa) nas costas, tornando-se muito difícil retirar o quimono.
Até o penteado, a maquilagem e o quimono, também tiveram de ser alterados para mais simples do que o das oirans, porque a beleza teve de estar na sua arte e não nos seus corpos.
As gueixas começaram a ser preferidas às oirans, ganharam tanta popularidade, que no ano 1750todas as oirans tinham desaparecido do comércio do sexo.

Mas outras novas concorrentes das gueixas (as hanamachi) foram aparecendo em Kyoto e noutras cidades, fazendo-lhes concorrência porque podiam ter sexo. Antes do século 19, as gueixas estavam na moda e eram as preferidas às mulheres comuns, embora com muitos problemas de origem puritana, na sociedade japonesa. Quando os homens contratam gueixas para animar uma festa, o assunto "sexo" normalmente nem sequer é mensionado. A função da gueixa é o entretém por intermédio do canto, música, dança, relato de histórias, atenção e flerte.

Elas podem conversar sobre política, com a mesma desenvoltura com que explicam as regras de um jogo. Tudo isto acontecia, porque nessa época as esposas japonesas eram excluídas da vida pública e eram as gueixas as únicas mulheres que podiam exercer o papel de anfitriãs numa reunião de negócios.
Alguns homens ricos, os danna, (patronos) pagavam muito dinheiro para conseguir a atenção pessoal de uma gueixa.
As gueixas não podiam casar-se, e muitas, principalmente as favoritas, tinham um danna (patrão ou patrono), que lhes exigia exclusividade, tendo por isso que lhes pagar as suas despesas.
Um danna era tipicamente um homem rico, às vezes casado, que tinha meios de apoiar as enormes despesas relacionadas à formação tradicional de uma gueixa e entre outros custos. Ainda hoje ocorre esta situação, embora muito raramente.

Uma gueixa e o seu danna podem ou não estar apaixonados, mas a intimidade nunca é tida como uma recompensa desse suporte financeiro do danna. As convenções tradicionais e os valores dentro dessa relação, são muito intricados e não muito bem entendidos, até pelos próprios japoneses.
Muitas pessoas pobres, vendiam as suas filhas às casas de chá hanamachi para lhes garantirem um sustento. Outros homens, pagavam muito dinheiro à dona das casas de chá, para conseguir a virgindade das novas meninas (mizuaje) e davam muito pouco aos pais que tinham negociado a sua própria filha.
Mas a reputação e o respeito às gueixas, cresceu novamente na época da Restauração Meiji, que se estendeu até depois da Segunda Guerra Mundial.
Foram criadas mais leis importantes para as protegem, como por exemplo, as meninas jovens não podiam ser vendidas às casas de chá, e a virgindade das jovens geishas não podiam ser compradas sob pena de pesada multa e até prisão. Desde então, as mulheres só se tornariam gueixas, pela sua própria vontade.

O elegante, mundo da alta cultura de que a gueixa faz parte, é karyūkai (柳界 “a flor e mundo de salgueiro”).
Uma gueixa famosa, Mineko Iwasaki, disse que lhes é dado este nome porque: - “Uma gueixa é como uma flor, bela no seu próprio estilo, e deve ser como um salgueiro, graciosa, flexível, e forte.”
Outra gueixa famosa, Kiharu Nakamura (em japonês:中村 喜春 ) (14 de abril de 1913 - 5 de Janeiro de 2004), foi uma das mais famosas gueixas, considerada a "última gueixa".

Durante a Segunda Guerra Mundial, casou com um homem influente, foi mandada como espia para a Índia, pelo governo do Japão, ficando encarregada de transmitir mensagens secretas.
Quando regressou ao Japão no final da guerra, encontrou o seu país muito diferente, abalado, destruído. Decidiu que já não havia ali lugar para ela e resolveu mudar-se para os Estados Unidos da América, tornando-se professora de shamisen, música e também como consultora de teatro e ópera, inclusive fez parte da ópera Madame Butterfly. Morreu no Queens, distrito de Nova Iorque aos 90 anos de idade.

Uma gueixa aprendiza, é designada como o nome de “maiko” (em japonês: 舞妓) e, tal como as gueixas, elas são uma raridade no Japão. Uma jovem pode tornar-se “maiko” aos 16 anos de idade e têm de aprender várias artes tradicionais japonesas, como a cerimónia do chá, a tocar diversos instrumentos, aprendem canto, dança, a fazer arranjos de flores, entre outras artes, e também têm de familiarizar-se com o antigo dialeto de Kyoto. Mas mesmo assim, nem todas se tornam geishas, somente as melhores, as que se destacarem, podem receber o honrado título de geisha aos 21 anos.

A gueixa moderna ainda vive nas tradicionais casas chamadas "okiya", em áreas chamadas “hanamachi”, (花街 "cidades de flor"), particularmente durante a sua aprendizagem. Muitas gueixas experientes, que se tornaram bastante prósperas, decidem depois viver independentes.
Nos anos 20 havia mais de 80.000 gueixa no Japão, mas hoje há muito menos. O número exacto é desconhecido para estrangeiros, mas estima-se que sejam pouco mais de 1000.
O elegante mundo de alta cultura de que a gueixa faz parte, é o "karyūkai" (花柳界 "a flor e mundo de salgueiro").
Ser gueixa não é uma simples opção. Para se tornar mestra do entretenimento masculino, as maikos (aprendizes) precisam muito mais do que dotes artísticos e um rosto sem borbulhas. Afinal, elas são treinadas para amansar os egos dos homens mais poderosos do Japão, sejam eles políticos famosos, abastados empresários ou temidos yakuzas (mafiosos).
Todos eles milionários, que não se importam em esbaratar fortunas, para serem inebriados nas suas próprias fantasias. Por outro lado, ter muito dinheiro dinheiro, não é um passaporte garantido para o aparentemente inacessível universo das gueixas. O que significa que uma conta bancária choruda não basta para ser bem-vindo nas luxuosas casas de chá, em que as gueixas entretêm os seus clientes em Kyoto, Tokyo e e outras poucas cidades japonesas. A chave de entrada é ser amigo de alguém com trânsito livre nessa sociedade privada e misteriosa.



A gueixa e a maiko usam um kimono de seda tradicional e tamancos de madeira. No cabelo, um arranjo esculpido armado ao alto, é adornado através de acessórios metálicos. O kimono é feito com uma faixa de seda larga e grossa chamada “obi”, que são amarrados de maneiras diferentes e deveras complicados.
O kimono das maikos são mais coloridos, mais brilhantes do que os das gueixas. Possuem mangas longas e esvoaçantes, que deslizam até o chão. O colar de uma maiko é sempre da cor vermelha, que se destaca no seus pálido pescoço.
Há uma cerimónia de ‘mudança de colar’, onde a maiko troca o seu colar vermelho pelo branco, que simboliza a passagem quando ela se torna numa gueixa.
A maquilhagem consiste numa pintura completa do rosto, com uma pasta branca (oshiroi) e o desenho dos olhos é reforçado com delininhador, um pouco de sombra é aplicada nos cantos dos olhos e finalmente os lábios são pintados de vermelho.

As jovens que decidem tornarem-se gueixas nos tempos actuais, começam a sua formação depois de concluir o ensino médio, pois têm de complementar a sua formação com o estudo de instrumentos tradicionais como o shamisen, shakuhachi (flauta de bambu), e tambores, bem como canções tradicionais, dança tradicional japonesa, cerimónia de chá, literatura e poesia. Se tiverem sorte e habilidade para isso, começam as suas carreiras na idade adulta.

A maiko Fukuyuki (à esquerda), de 18 anos, diz que os pais ainda não entendem a sua decisão de querer ser gueixa.
Kimisome (à direita), de 21 anos, zangou-se com a família quando decidiu mudar-se para Oki-ya e hoje os contactos com a família, resumem-se ao estritamente necessário.

Actualmente, existem poucas gueixas, pouco mais de mil por todo o Japão. Muitas vezes sào contratadas para assistirem a festas e reuniões, tradicionalmente em casas de chá ou em restaurantes japoneses tradicionais (ryōtei). O seu tempo é medido pela queima de um bastão de incenso, chamado senkōdai ou gyokudai. Em Quioto os termos de "ohana"e "hanadai", que significam "taxas de flor", são os preferidos, pelos importantes empresários que têm orgulho quando se trata de negócios com os estrangeiros, em lhes mostrar que ainda há tradições no Japão.

A vida das gueixas, inspiraram muitos escritores, e algumas chegaram a escrever a sua própria história que dos livros, saltaram para o cinema.
“Memórias de uma Gueixa”, por exemplo, gerou muita polémica no Japão. Afirmando que não existem atrizes japonesas no mercado com um bom inglês, Rob Marshall contratou duas chinesas (Zhang e Li) e uma malaia (Yeoh) para interpretar o papel das suas gueixas. Esta opção gerou quase uma crise diplomática em terras nipónicas quando foi anunciada.
Imagine-se um filme sobre o fado com actores espanhois?! Pois bem, foi assim que os japoneses se ressentiram. Não era para ter actrizes japonesas com bom inglês e sim actrizes japonesas a falar japonês. Mas enfim, o que importa, é que o nome de gueixa continue a ser respeitado e divulgado como fazendo parte de uma fantástica e original cultura, que é a do Japão.

Os homens japoneses, sabem dar-lhes o seu devido valor, olhando-as quase como divindades vivas, ou apenas como o ideal da mulher perfeita: bela, servil e sempre disposta a agradá-los. Alheias a isso, as gueixas, anónimas, camufladas pela maquilhagem branca e enfiadas nos seus ricos quimonos, perseguem o sonho de preservar a sua arte e uma das mais belas peculiaridades das mulheres, que é a sua feminidade.

2 comentários:

Anónimo disse...

Lembro de ter assistido recentemente o filme "História de uma gueixa". Lindo e emocionante.
:)

Soraya Silva disse...

Há uma gueixa famosíssima em tóquio que é rapaz:Eitaro, dono de Okiya.