quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Frasquinhos de rapé

Em finais da Dinastia Ming, o tabaco chegou à China através de pequenos frascos que se foram gradualmente introduzindo em todas as províncias.
Mas esta arte nasceu um pouco ao acaso: nos finais da Dinastia Qing, um funcionário viciado em rapé, parou perto de um pequeno templo para descansar. Pegou na sua pequena garrafa de cristal que continha rapé para o cheirar, e achou que já estava vazia. Então, ele na esperança de conseguir mais algum pó, raspou um pouco do que estava agarrado às paredes interiores do frasco, com uma pequena e fina vara de bambu, que foi deixando algumas linhas visíveis no seu interior, que se viam através da parede transparente do frasco.
Um jovem monge que o observava com uma certa curiosidade, reparou então nesses riscos e teve uma inspiração: a de fazer um desenho no seu interior! Assim, uma nova arte nasceu!
Inserir uma caneta delgada especialmente concebida com uma curva na ponta através do gargalo, contar com um talentoso artista que trabalha no espaço apertado da cavidade da garrafa, capaz de gravar desenhos vivos e caligrafias na superfície interna da garrafa, torna a pintura interna das garrafas de rapé numa forma de arte única.
A técnica da "ousada pintura" dos artistas de hoje, que pintam estes pequenos frascos, não são muito diferentes da usada no início da sua invenção.
Este tipo de habilidade desenvolvida em pintar o interior das garrafas, deu origem a verdadeiras obras de arte.
O comércio dos pequenos frascos tem prosperado em todas as provincias chinesas, tornou-se hoje num importante património cultural da China.
Em qualquer loja ou Centro Comercial, podemos ver expostos, dezenas destes frasquinhos a preços acessíveis, dado que todos eles são pintados à mão, não só pelos mestres, como por alunos de escolas desta arte, agora espalhadas por toda a China.
Sem dúvida, os frascos que mais interesse despertam entre os coleccionadores, são a pintura dos seus interiores. Como por exemplo este lindo frasco de cristal translúcido com esta bela e colorida imagem pintada no seu interior.Encontrei este simpático artista de frasquinhos, pintado ali ao vivo, no Mercado da Seda, em Pequim, e não resisti em ficar algum tempo a observá-lo. É incrivel como é possível tanta precisão e meticulosidade, para as imagens saírem tão perfeitas! Parece magia o que estes artistas conseguem fazer num espaço tão pequeno.
Ele contou-me que, desde muito jovem, começara a aprender esta arte, porque hoje existem muitas escolas, mas há doze anos atrás, eram escolhidos os mais habilidosos e que tivessem inclinação para a pintura e os mestres eram muito exigentes com a perfeição dos desenhos.
É claro que comprei mais um frasquinho...
Normalmente estes pequenos frascos vêm metidos em vistosas e acolchoadas caixinhas, não só para a sua protecção, como também se torna igualmente uma bonita oferta.Com o passar do tempo, estes pequenos frascos deixaram de ser utilizados para transportar o pó de rapé para apenas se tornarem em objectos decorativos e de colecção para círculos palacianos, escolares de literatos e também para as classes mais marcantes da sociedade da Dinastia Qing.
De tamanhos e formas diversas e devido ao seu pequeno tamanho, são fáceis de coleccionar e a sua decoração interior é tão versátil e diversificada, que é impossível conseguir uma colecção única, porque varia de gosto de artista para artista, desde desenhos de animais, pessoas, paisagens até à caligrafia, podemos encontrar um pouco de tudo nestas artísticas miniaturas. Na tradição chinesa, quem possuir gravuras ou algum objecto onde apareçam episódios dos “oito imortais”, terá um comportamento altamente moral e sábio e um dia se converterá num dos imortais.
Muitos pintores chineses são, ao mesmo tempo, poetas e calígrafos. Eles frequentemente acrescentam um poema da sua própria autoria e, invariavelmente, autenticam-no com o seu selo (nome).Estes pequenos frascos de rapé, que podem ser de vidro, porcelana ou ágata, são de pequena dimensão, não mais de 6-7cm de altura e 4-5 cm de largura, mas o talentoso artista pode produzir, no espaço limitado das paredes internas, qualquer assunto sobre toda a gama de pintura tradicional chinesa - retratos humanos, caligrafia, plantas, paisagens, flores, insectos, peixes, pássaros, parecendo estar cheios de vida.
Podem encontrar-se dentro destes pequenos frascos outros temas como lendas folclóricas chinesas, episódios históricos, religião e filosofia (confucionismo, taoísmo e do budismo chinês). Outros temas pintados, são puramente decorativos que indicam os bons desejos e expectativas das pessoas como o da boa sorte e felicidade, justiça, boas colheitas, saúde e longevidade.Actualmente, podemos encontrar estes pequenos frascos já sem a pintura interior, mas com pinturas externas, que também atraem muitos coleccionadores devido aos seus exóticos desenhos e a técnicas muito próprias da cultura chinesa.

2 comentários:

Roberto (Brasil) disse...

16.03.2011
Prezada Irene,
Li recentemente uma matéria sobre frasco de rapé chineses em um antigo exemplar da "Seleções do Reader's Digest" (Março/1976), intitulado "O aroma dos deuses". Achei interessante e quis pesquisar algo na Internet, deparando-me com sua página. Obrigado pelas novas informações e fotos. Curioso ver como uma peça originalmente destinada a um determinado fim adquiriu personalidade própria e o "status" de arte. Hoje em dia nem se ouve mais falar em rapé ou quem o use...

Irene Fernandes Abreu disse...

Muito obrigada Roberto pelo seu comentário. Adoro a arte/cultura chinesa, até porque vivo na China há muitos anos e há um mundo de coisas interessantes para aprender e partilhar. Abraço