sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Favor oculto

Um dia destes, entrei numa pastelaria, que fica na esquina do meu emprego. Pedi um café, e vi que um guarda estava a olhar atentamente para um carro estacionado um pouco à sua frente, porque estava ligeiramente em cima da passagem para peões.. Tirou o bloco das multas e já de caneta em punho, pronto para escrever uma "factura", quando eu saí e falei com ele:
- Bom dia senhor guarda!...
Ele não respondeu, e eu argumentei que a roda do carro estava fora da faixa e que havia muita dificuldade em arranjar um lugar. Além disso, o carro não estava a incomodar, apesar de não estar exactamente no lugar correcto, porque o outro grandalhão de trás, estava mal estacionado, a ocupar demasiado espaço.
O guarda nem me olhou, mas prestou mais atenção à posição do carro que podia de facto estar melhor, se não fosse a mania das grandezas do outro condutor, que estacionou o seu carrão egoistamente à vontade.
Reparei que ele estava a olhar atentamente para os pneus, e nesse momento, eu também vi que eles não estavam em condições de uso e apressei-me a argumentar:

- "Desculpe senhor guarda, mas foi hoje mesmo que percebi que estes pneus estão no momento de serem trocados..."
Só então é que ele me olhou, baixando o bloco das multas. Percebi que fraquejava na sua resolução de lavrar a multa. Nesse momento, ambos reparámos que uma velhinha estava parada perto da faixa, e percebemos que ela estava com dificuldade em atravessar a rua, olhando aflita os carros que não abrandavam na passadeira.
Então por instinto, eu antecipei-me a ele e ajudei a senhora a atravessar a rua.
Quando voltei, o homem tinha guardado definitivamente o bloco.
Então eu sorri e, apelando a todo o meu charme, comentei em voz baixa:
- "Você é muito compreensivo e boa pessoa, senhor guarda!"
- "Bem... bem... você merece!" – respondeu ele, voltando-me as costas e seguiu o seu caminho.
Fiquei encostada ao carro, esperando que o guarda se afastasse, para não descobrir que eu não era a dona dele. Quando perdi o homem de vista, surgiu uma senhora ainda muito jovem, com um enorme saco numa das mãos e uma criancinha de colo na outra.
-"Dá-me licença, por favor?" – disse-me, querendo entrar no carro.
Eu afastei-me, e ela abriu a porta do lado do passeio, colocou o grande saco no banco e instalou a criança na cadeirinha. Então eu resolvi falar:
-"Olhe minha senhora, deve estacionar um pouco mais distante desta esquina, senão pode levar uma multa, porque um guarda andou por aqui à pouco e foi uma sorte..."
- "Ah sim, obrigada... É que o meu filho está doente, e eu tinha hora marcada no médico, fartei-me de dar voltas e não encontrei outro lugar melhor..."
Eu sorri para ela e balancei a cabeça em sinal aprovativo. Ela entrou no carro e partiu.
Não sei porque fiz isto, já não é a primeira vez que, quando vejo um guarda para multar um carro por falta de moeda, vou a correr lá meter uma, só para ter o prazer de lhes ver o ar desiludido e sentir-me tranquila por ter salvo alguém de uma multa, nunca são bem vindas, certo?
Perdida nestes pensamentos, regressei à mesa, mas o meu café já estava frio e tive que pedir outro. Paguei satisfeita os dois, porque tinha a minha alma leve... e umas das coisas importantes da vida, é ter a alma leve...

2 comentários:

António Manuel Fontes Cambeta disse...

Estimada Amiga e Ilustre Romancista Irene,
Linda esta histório, que até deduzo ter sido real, praticou uma boa acção e ficou com a alma mais leve como convém.
Nem todos o s polícias são assim tão compreensivos, eu o era por vezes,, mas a lei não olha a quêm.
Com tudo isto lá deixou arrefecer o seu cafézinho e eu neste momento estou bebndo um bem quentinho para começar bem o dia.
Um abraço amigo e óptimo fim de semana

Zé Carlos disse...

Olá Irene, eu sempre achei que vc era um amor de pessoa, acabo de ter mais uma prova disso.

Bjs do teu amigo