terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Os Filhos...


Os vossos filhos
Não são vossos filhos:
São filhos e filhas
Do chamamento da própria Vida.

Vêm por vosso meio
Mas não de vós;
E apesar de estarem convosco,
Não vos pertencem.

Podeis dar-lhe o vosso amor;
Mas não os vossos pensamentos:
Porque eles têm pensamentos próprios.

Podeis acolher os seus corpos;
Mas não as suas almas:
Porque as suas almas
Habitam a casa de amanhã
Que não podeis visitar,
Nem sequer em sonhos.

Podeis esforçar-vos por ser como eles;
Mas não tenteis fazê-los como vós.
Porque a vida não vai para trás,
Nem se detém com o ontem.

Sois os arcos, e os vossos filhos
As setas vivas projectadas.

O Arqueiro vê o alvo no caminho do infinito,
E reteza-vos com o seu poder
Para que as setas
Possam voar depressa para longe.

Que a vossa tensão na mão do Arqueiro
Seja de alegria.

Porque assim como Ele gosta
Da seta que voa,
Também gosta do arco que fica.
Khalil Gibran
O Arqueiro - pintura feita pelo próprio Khalil Gibran
Escolhi este poema, primeiro porque é o meu favorito e depois porque cada vez mais sentimos que os filhos se afastam dos pais, e que a nossa missão é apenas de os colocar no mundo e… rapidamente deixamos de fazer parte do mundo deles.
Este poema parece vir ao encontro das nossas dúvidas e anseios.
Este autor “aconteceu-me” como tudo me tem acontecido na vida — por destino, por acaso, por qualquer lei cuja origem e fundamento ignoro e me faz tropeçar muito de vez em quando, ao longo da minha viagem pela estrada da poesia, na beleza que em forma de verso bate no rosto do mundo.

A extrema elevação espiritual de Gibran encontram-se apenas nos eleitos que nos dão uma visão deslumbrante da vida e das coisas mais nobres entre o homem e Deus.
- “É o coração que sente a Deus e não a razão” (Pens., 278), disse arriscadamente Pascal, já que o coração tem razões que a razão desconhece e assim, apesar da indiferença e às vezes o desprezo que muitos filhos sentem pelos seus progenitores, o que mais desejamos é que os nossos filhos encontrem de facto o verdadeiro caminho do bem e consigam caminhar pela vida de cabeça erguida, será essa a nossa recompensa.

Khalil Gibran foi um pintor e poeta libanês (1883-1931) que repartiu a sua vida pela Palestina, Grécia, Itália, Espanha e França. Conviveu com muitas celebridades que lhe deram uma visão mais ampla do mundo. A sua cultura e sensibilidade fizeram dele um autor que acreditava não haver fronteiras entre o poético e o sagrado.

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